Restaurante Popular, em Curitiba, 2 mil refeições são servidas diariamente a R$ 1. Para os próximos dois anos, estão previstas mais quatro unidades Segurança alimentar
Alimentação, direito de todos
Campanha pede a inclusão do direito à alimentação na Constituição Federal. Hoje, 14 milhões de pessoas passam fome no Brasil
Publicado em 15/09/2009 | Paola CarrielNo filme Garapa são contadas histórias de três famílias nordestinas que não têm comida para dar aos filhos e fazem uma espécie de melado para garantir energia aos meninos e meninas. A realidade, no entanto, encaixa-se em todo o Brasil. Uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) com base nos dados de 2004 da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) mostrou que 35% da população, cerca de 72 milhões de pessoas, têm insegurança alimentar. Os níveis são divididos em leve, moderada ou grave, o que significa limitação de acesso quantitativo aos alimentos, com ou sem situação de fome. Há 6,5% da população no último estágio. Isso significa que perto de um a cada 13 brasileiros não teve o que comer durante os 90 dias que antecederam a pesquisa.
Programas reduzem a fome no país
As três políticas unânimes na área de segurança alimentar entre especialistas são o Bolsa Família, o Programa de Aquisição de Alimentos – mais conhecido como Compra Direta – e o Restaurante Popular. Elas tiveram impacto direto na questão da fome no Brasil. A transferência de renda é apontada como a principal mudança porque hoje são 12 milhões de famílias beneficiadas em todo o Brasil. No Paraná, há mais de 1 milhão de pessoas.
R$ 1 para a única refeição do dia
Na fila do Restaurante Popular em Curitiba circulam desde funcionários de pequenos comércios até quem não tem renda suficiente para se alimentar e depende do local para fazer a única refeição do dia. Este é o caso do aposentado Francisco Cristovam da Silva, 52 anos.
Política de Estado
Os especialistas acreditam que o Brasil pode dar um exemplo para o mundo ao incluir o direito à alimentação em sua Constituição. Isso porque as políticas deixariam de ser apenas de um governo para se tornarem políticas de Estado. Foi o que ocorreu com o Sistema Único de Saúde e com a Sistema Único de Assistência Social, por exemplo. Cria-se um sistema de garantias para que toda a população possa ter acesso a alimentos de qualidade. Os poderes Executivo e Legislativo federal, estaduais e municipais terão como metas a implementação de políticas e a fiscalização por parte do Ministério Público ficará mais fácil.
Hoje, é possível observar ações em vários setores das três esferas de governo. Isso ocorre porque a segurança alimentar demanda ações conjuntas, mas o problema é que não existe uma coordenação geral e articulada. Em muitos casos existem políticas municipais, mas não há diálogo com as estaduais. Outra questão é que, além do acesso imediato ao alimento, é preciso trabalhar áreas como fortalecimento da agricultura familiar, geração de renda e a institucionalização do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional.
O economista e professor da Universidade de Brasília Newton Narciso Gomes Junior afirma que a inclusão da alimentação como direito social na Constituição será muito positiva para a questão da fome no país, no entanto, ele reforça que as garantias fundamentais não podem ser dissociadas umas das outras. Assim, o acesso ao alimento não será totalmente efetivado se não for complementado pela saúde e educação. “Não adianta ter um pouco de saúde e um pouco de alimentação. Isso não são direitos básicos garantidos. Eles não são hierarquizáveis ou dissociáveis”, explica. “Mas a inclusão desse item na Carta muda a perspectiva. A fome se trata com urgência e o direito é mais amplo, trata da condição humana.”
O deputado federal Nazareno Fontelenes, presidente da Frente Parlamentar de Segurança Alimentar da Câmara dos Deputados, afirma que o alimento sempre foi tratado como mercadoria e não como direito. “A partir da aprovação da PEC, a própria população vai poder exigir e monitorar essa questão.” Fonteneles diz que é preciso garantir tanto o acesso quanto a produção, criando políticas amplas e de abrangência geral. Outra questão defendida pelo deputado é a ampliação do Bolsa Família. Quem está na linha da pobreza teria uma renda secundária garantida. Ele argumenta que a proteção social está presente em diversos países da Europa. “É claro que é preciso autonomia. Mas as universidades públicas, por exemplo, são preenchidas majoritariamente com pessoas que têm boa renda e ninguém acha que isso é esmola”, explica. “Hoje o país está no caminho certo. Enquanto em outros locais a fome está crescendo, seguimos o caminho inverso.”
Para a nutricionista e professora da Pontifícia Universidade Católica do Paraná Maria Teresa Gomes de Oliveira Ribas ao se tornar um direito social, a alimentação organizará a oferta de serviços nos moldes de um sistema, como ocorre com a assistência social, por exemplo. “A lei terá de estipular as instâncias de funcionamento, a responsabilidade do Estado e a assistência em nutrição. Quando o alimento é inserido em uma lei máxima, como é a Constituição, torna-se uma garantia permanente. O direito à alimentação é o direito à própria vida.”
Outra questão que Maria Teresa lembra é o aumento da obesidade na população brasileira. “Nem conseguimos superar a questão da fome e já temos de enfrentar todos os desdobramentos e comorbidades relacionadas à obesidade.” Ela explica que a falta de informação e alimentação adequada, mesmo para quem tem condições financeiras, é uma violação de direitos.
Serviço:
A campanha será lançada hoje em Foz do Iguaçu. O evento começa às 19h30 no Centro de Recepção de Visitantes da Itaipu Binacional.
GAZETA DO POVO 10:37
Foz do Iguaçu com 325 mil habitantes não tem restaurante popular. O que será que falta para implatação?
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