Prazer, nojo, culpa, preconceito, liberdade e autonomia, vaidade e medo. De acordo com o estudo da socióloga e antropóloga Glória Diógenes, que atualmente está à frente da Secretaria de Direitos Humanos de Fortaleza (SDH), são esses os sentimentos que compõem o misto de emoções envolvidos com o ato de fazer programa, ao menos no que diz respeito a menores de idade. Fruto de pesquisa da autora na área que remonta ao ano de 1998, o livro Os Sete Sentimentos Capitais & Exploração Sexual Comercial de Crianças e Adolescentes, publicado originalmente em agosto de 2008, terá sua segunda edição lançada hoje a partir das 19 horas, no Mercado dos Pinhões. A primeira edição não foi vendida, tendo sido distribuída gratuitamente entre entidades e órgãos do poder público.
No livro, constam 11 textos organizados por Glória que desvendam detalhes das redes de exploração sexual de crianças e adolescentes em Fortaleza. A publicação é resultado de um árduo e meticuloso trabalho de campo realizado entre março e agosto de 2007 por educadores e pesquisadores da Fundação da Criança e da Família Cidadã (Funci), que visitaram dez locais de maior incidência da exploração sexual de crianças e adolescentes na cidade e traçaram um perfil da atividade, através do mapeamento das redes de exploração, a fim de melhorar e nortear as políticas públicas voltadas para a área. Além da própria secretária, que, à época, ocupava a presidência da Funci, mais seis pesquisadores assinam os capítulos da obra.
Além das visitas aos locais em que a prática da prostituição de crianças e adolescentes é verificada e dos levantamentos estatísticos, o aspecto diferenciador do livro é o registro dos aludidos ``sentimentos capitais`` de 328 crianças e adolescentes envolvidos nas redes de exploração. Essas falas, cotidianamente silenciadas e marginalizadas, ganham voz através dos testemunhos presentes no livro e ainda por meio da própria visão dos educadores, que não se furtam a contar, em detalhes, suas próprias percepções de pessoas, locais e atitudes vivenciadas.
Segundo Glória, a metodologia utilizada envolveu questionários, entrevistas aprofundadas, grupos focais e diários de campo. Tudo com o intuito de compreender melhor a dinâmica do problema. ``Esse estudo veio da necessidade de entender a exploração não só do ponto de vista das dimensões estatísticas, como, por exemplo, com que idade os jovens estão tendo suas primeiras relações sexuais e quantos fazem programa. Buscamos também perceber diferenças na forma como o fenômeno acontece em cada local da cidade``, explica a responsável pela SDH. Para ela, o modo de agir das redes de exploração é bastante diverso em zonas como a Praia do Futuro, as BRs, e as imediações da avenida Beira-Mar.
Acerca dos motivos pelos quais a questão da prostituição infantil tem alcançado tanta repercussão, a socióloga reluta em identificá-los apenas no plano econômico. ``Durante muito tempo, tudo era explicado por esse viés. Porque a menina é pobre, ela vai se prostituir. O que percebemos na pesquisa foi que a maioria nem tem um padrão de vida muito baixo não``, revela. As causas, portanto, derivariam de outros aspectos. ``Elas vêm de um ambiente de violência doméstica, de negligência familiar, coisas que as tornam retraídas. Por outro lado, na rua, elas enxergam um lugar de aceitação e a veem com fascínio``, explica Glória, para quem é justamente na análise desses sentimentos confusos de prazer, nojo, culpa, preconceito, liberdade e autonomia, vaidade e medo, assumidos por crianças e adolescentes em situação de risco diante do sexo, que está a chave para se entender o que cerca o mundo da exploração na cidade.
SERVIÇO
OS SETE SENTIMEN-TOS CAPITAIS - EXPLORA-ÇÃO SEXUAL COMERCIAL DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES - Reedição organizada pela socióloga Glória Diógenes. Edições Annablume, 263 páginas, R$ 25. Lançamento hoje no Mercado dos Pinhões (entre as ruas Nogueira Acioli e Gonçalves Ledo & Aldeota), a partir das 19 horas.
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