segunda-feira, 18 de abril de 2011

O cenário do Orçamento Público Federal de 2011 aponta limitações que podem dificultar avanços na garantia dos direitos das mulheres

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Neste ano, foi decretado um contingenciamento recorde, no valor de 50 bilhões de reais, atingindo todos os ministérios e, mais fortemente, as políticas que não têm vinculação ou proteção constitucional ao seu orçamento, como é o caso de muitos dos programas que atendem às mulheres.

Em geral, o que observamos é que os recursos orçamentários orientados nesse sentido tiveram pequenos aumentos em relação ao ano passado. Por isso, é fundamental que sejam priorizados e integralmente executados, não sendo alvo do bloqueio de recursos. A seguir, trazemos um breve cenário dos recursos autorizados para algumas dessas políticas:

Creches e pré-escolas têm mais recursos

Além do compromisso da Presidenta Dilma com a ampliação da oferta de creches, há também metas explícitas no II Plano Nacional de Políticas para as Mulheres para a oferta desses equipamentos. Os recursos orçamentários para a ampliação da oferta de creches estão no FUNDEB (Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica).

O Orçamento Federal de 2011 do FUNDEB é 21% maior do que o de 2010: temos 6,2 bilhões de reais a mais para a educação básica. Passamos de R$ 29,7 bilhões em 2010 para R$ 36 bilhões em 2011. Não é possível saber quanto desse total vai para o ensino fundamental e quanto vai para a educação infantil (zero a seis anos de idade). Mas esperamos que uma parte considerável desse aumento seja investida na ampliação da oferta de vagas em creches e pré-escolas. Para que essa oferta cresça é necessário compromisso governamental nos três níveis da federação - municipal, estadual e nacional. É preciso que o poder público se responsabilize para, de um lado, garantir os direitos das crianças e, de outro, para reduzir o peso injusto da dupla jornada de trabalho, que se traduz em exploração, desproteção social e dependência econômica na vida das mulheres.

A expectativa é que esses recursos a mais no FUNDEB compensem, e muito, a redução do montante autorizado para as ações do Programa Qualidade na Escola1. O orçamento desse ano para educação infantil no referido programa foi cortado pela metade (R$ 1,2 bilhão a menos, em relação ao orçamento de 2010). E é nesse programa que estão as ações responsáveis por financiar a criação e melhoria de estrutura e oferta vagas para a educação infantil pública, compromissadas no II Plano Nacional de Políticas para as Mulheres.

Ainda na área da educação, registramos um aumento expressivo de recursos para a gestão de política de educação, que conta com R$ 2,2 bilhões a mais na ação 00C5 - orientada à reestruturação de cargos, carreiras, revisão de remunerações e provimentos da educação.

Ressalvamos, no entanto, que o contingenciamento pode ter impactado tais recursos que, por isso, podem não ser integralmente executados em 2011.

Lei Maria da Penha: é preciso prioridade

A Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM) divulgou que os cortes impactaram em uma redução de apenas 4% do orçamento da pasta. Segundo a Ministra Iriny Lopes, o programa de prevenção e enfrentamento da violência contra a mulher não sofreu corte. No entanto, observamos que os recursos desse programa para 2011 - R$36 milhões - representam 10% a menos do que havia sido autorizado no orçamento de 2010, fato que se deve, em parte, aos vetos presidenciais sobre a Lei Orçamentária Anual, que recaíram sobre emendas parlamentares ao programa no total de R$ 5,4 milhões.

O montante autorizado este ano é considerado insuficiente para execução da política: no ano passado, a SPM reconheceu que os recursos seriam insuficientes para o atendimento às metas estabelecidas. Em nota encaminhada a parlamentares durante tramitação do orçamento em 2010, o órgão estimava que seriam necessários R$ 225 milhões para se chegar a um patamar adequado nesse programa.

É importante lembrar, também, o papel dos demais ministérios na execução da política. O Ministério da Justiça, por exemplo, tem responsabilidade sobre a implementação de políticas de enfrentamento à violência, com ações previstas no Pronasci (Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania): a ação 8857 - Apoio à Implementação de Políticas de Segurança Cidadã - que tem parte dos recursos orientados à efetivação da Lei Maria da Penha. De 2010 para 2011, o aumento de recursos nessa ação foi de 3,6%, o que agrega R$ 6 milhões, um montante pequeno diante do aumento total do programa, que ficou na marca dos 17% (ou seja, R$318 milhões).

Com menos recursos em caixa, é fundamental garantir, no mínimo, que todo o montante seja executado. Há que se garantir prioridade ao gasto com tais ações, contribuindo para romper o ciclo de violência a que essas mulheres estão submetidas e, em última análise, evitar que elas morram.

Mais recursos para saúde, e menos estrutura para a atenção integral à saúde da mulher

Na área de saúde, há algumas boas notícias: aumento de R$ 6 bilhões nos valores autorizados, a maior parte deles para o programa 1220, orientado para a Assistência Ambulatorial e Hospitalar Especializada. O programa é responsável por ampliar o acesso da população aos serviços ambulatoriais e hospitalares do Sistema Único de Saúde. Dentro desse programa, a ação que mais teve aumento foi a ação 8585 - que garante atenção à saúde da população para procedimentos de média e alta complexidade, cujos recursos financiam os atendimentos, consultas, exames, tratamentos, internações, cirurgias e outros procedimentos complementares no SUS.

Já para a ação específica de saúde da mulher2, o aumento foi de 25% com R$ 2,2 milhões a mais em relação a 2010. Temos 11,7 milhões autorizados para 2011, o que representa apenas 0,02% do total dos programas e ações da área de Saúde, monitorados pelo CFEMEA a partir do Orçamento Mulher.

Apesar do aumento de recursos na área da saúde, dois pontos merecem atenção. Em primeiro lugar, há uma clara sinalização por parte do governo de uma mudança de foco: ao invés da saúde integral da mulher, a saúde materno-infantil. O Programa Rede Cegonha, lançado no último dia 28 de março, revela essa perspectiva reducionista. É um retrocesso em relação à Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher, definida em 2004, com base na proposta do movimento feminista; e ao PAISM (apresentado em 1983 e parcialmente implementado pelo Ministério da Saúde).

Outro sinal de alerta refere-se ao processo em curso de esvaziamento das atribuições da Área Técnica de Saúde da Mulher, com a assinatura da Portaria de 21/12/2010 pelo então Ministro da Saúde José Gomes Temporão ao final de sua gestão. Tal Portaria define o Instituto Fernandes Figueira da FIOCRUZ como “Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente para atuar como órgão auxiliar do MS no desenvolvimento, na coordenação e na avaliação das ações integradas para a saúde mulher, da criança e do adolescente no Brasil”. Diante disso, a Rede Feminista de Saúde encaminhou carta ao atual Ministro da Saúde Alexandre Padilha questionando a validade e solicitando informações sobre a referida Portaria, assinada sem nenhum diálogo prévio com os movimentos nas instâncias de controle social, como o Conselho Nacional de Saúde.

Qualificação profissional

A qualificação social e profissional é um fator importante na busca das mulheres por autonomia econômica. Para a qualificação profissional, foram autorizados R$ 271 milhões no orçamento de 2011, valor que supera em 15% o de 2010. Esse programa, apesar de já ter superado os Índices de Cobertura da População de Mulheres e da “População Não Branca”, continua, em 2011, sem executar a ação específica voltada à qualificação de trabalhadoras domésticas. O problema, que desde 2008 reclama solução, persiste. Posto que essa é a categoria que reúne o maior número de mulheres economicamente ativa, a inoperância dessa ação, ano após ano, é algo que tem de ser destacado.

É preciso monitorar

Como o orçamento é apenas autorizativo, o governo não é obrigado a gastar tudo aquilo que foi previsto para o ano. Desta forma, o fato de termos recursos autorizados no orçamento de 2011 não são garantia de que serão realmente gastos.

Por isso, é fundamental que se monitore e exija que o governo dê prioridade aos recursos para as políticas que promovem direitos das mulheres.

Seguiremos monitorando e informando sobre os recursos e sua execução em 2011!

Nos últimos nove anos, os movimentos de mulheres e feministas brasileiros vêm acompanhando o orçamento público federal através da metodologia do Orçamento Mulher, desenvolvida pelo CFEMEA, o que permite aferir a execução dos gastos públicos em programas e ações destinados à melhoria das condições de vida da população, principalmente daquelas que têm impacto no combate às desigualdades de gênero e étnico-raciais.

O Orçamento Mulher pode ser consultado pelo link do Siga Brasil3, com atualizações diárias. Acompanhe pelo nosso site (www.cfemea.org.br)

(1) A ação 0509 – que garante o apoio ao desenvolvimento da educação básica tem 850 milhões a menos, uma perda de 62% em relação a 2010. A outra ação que perdeu 37% de recursos é a 09CW – que apóia a reestruturação (construção, ampliação, reforma, adequação) da rede física pública da educação básica.
(2) Ação 6175 – Atenção Integral à Saúde da Mulher, do Programa 1312 – Promoção da Capacidade Resolutiva e da Humanização na Atenção à Saúde.
(3) Disponível em: www.senado.gov.br/siga, Orçamentos Temáticos, Orçamento Mulher.

Fonte:http://www.feminismo.org.br/li

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